quarta-feira, 10 de outubro de 2012

The Night



"A vida é rápida e surpreendente. Sabe isto mais pelos outros do que por si. Não param de chegar notícias. A fractura da anca de um dos filhos do seu vizinho. O suicídio de uma paciente do consultório. A prima que subitamente se tornou famosa por ter ganho um prémio como jornalista. Para não falar nas notícias do jornal que lhe é posto todos os dias diante da porta de casa. Antes ainda se conseguia perceber alguma coisa, agora já nada há para entender, diz ela mal chega ao consultório. O Dr. Flynn acena que sim com a cabeça e baixa os olhos  como se tivesse entristecido bruscamente. Convida-a para almoçar no restaurante do hotel do costume. Os criados são silenciosos. A vista do último andar impressiona. Não trocam uma palavra. Não por já nada terem para dizer um ao outro mas porque se entendem sem precisar de falar. Talvez seja o amor entre duas solidões a tentarem vencer o vazio que as separa, passa-lhe pela cabeça. Não sabe exactamente o que querem dizer aquelas palavras. Se o Dr. Flynn tivesse menos trinta anos talvez fossem amantes e felizes. Ao descerem no elevador ele diz: gostaria de ter tido uma filha como tu. Ambos olham em frente para a porta em chapa de zinco que lhes espelha foscamente os corpos e que de um momento para o outro se vai abrir. A porta abre-se. As sombras saem. Trinta anos. Trinta translações elípticas do planeta chamado Terra em torno de uma  estrela menor chamada Sol."
Pedro Paixão

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