sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

 [photos by play bleu 2012]

O sonho é a pior das cocaínas, porque é a mais natural de todas. Assim se insinua nos hábitos com a facilidade que uma das outras não tem, se prova sem se querer, como um veneno dado. Não dói, não descora, não abate – mas a alma que dele usa fica incurável, porque não há maneira de se separar do seu veneno, que é ela mesma.

Fernando Pessoa

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Like a Rolling Stone

[photos by play bleu 2006]

"Acordo com um ferro no coração. Qualquer movimento pode reabrir a ferida. O melhor é ficar quieto, aproveitar estes minutos, sentado na varanda com vidros que me isolam do mundo a olhar o areal imenso e o mar branco lá ao fundo. Nada mexe e eu não me mexo. Se houvesse um sentido era assim.
- Os amantes sabem por que morrem, Nos teus braços morreríamos"

Pedro Paixão 


segunda-feira, 24 de junho de 2013

Quarto Escuro

[photos by play bleu 2013] 

"Ela sabe que não se consegue precisar o momento, a hora, o dia em que uma pessoa fica apaixonada. Sempre um pouco antes, sempre um pouco depois. Ela sabe que não se pode revelar definitivamente como, e porquê, uma pessoa ficou apaixonada por esta pessoa, precisamente esta, e não por outra muito parecida com ela. Qualquer razão perde a razão. O que uma pessoa pode sentir é se está ou não apaixonada. Que houve um estreito abismo, sem saber quando nem como, sobre o qual sabe que saltou. Sem poder avaliar as consequências. Como uma doença. Não é só isso. Uma pessoa quando está apaixonada não está continuamente apaixonada, muito menos com a mesma intensidade. Varia muito. Acontece uma pessoa duvidar se está ou não apaixonada. Ficar totalmente baralhada. É mais fácil uma pessoa sentir a paixão por outra pessoa quando ela não está presente. Isso parece-lhe um facto. A sua ausência aumenta o poder da sua presença. A paixão é mais sua, mais inteira, há menos interferências. Com ela é assim. Sente um vazio que só o outro, único no mundo todo, vai poder preencher, sarar, cuidar. Uma espécie de saudade imperiosa. Uma questão de vida ou de morte."
Pedro Paixão 

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Someday


estás tão bonita hoje. quando digo que nasceram 
flores novas na terra do jardim, quero dizer
que estás bonita. 

entro na casa, entro no quarto, abro o armário, 
abro uma gaveta, abro uma caixa onde está o teu fio 
de ouro. 

entre os dedos, seguro o teu fino fio de ouro, como 
se tocasse a pele do teu pescoço. 

há o céu, a casa, o quarto, e tu estás dentro de mim. 

estás tão bonita hoje. 

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios.

estás dentro de algo que está dentro de todas as 
coisas, a minha voz nomeia-te para descrever 
a beleza. 

os teus cabelos, a testa, os olhos, o nariz, os lábios. 

de encontro ao silêncio, dentro do mundo, 
estás tão bonita é aquilo que quero dizer. 

José Luís Peixoto, in "A Casa, a Escuridão"

 

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Demons

[photo by play bleu 2012]


«Quase gosto da vida que tenho. Não foi fácil habituar-me a mim. Tive de me desfazer das coisas mais preciosas, entre elas de ti. Sim, meu amor, tive de escolher um caminho mais fácil. O dinheiro também tem a sua poesia. E tenho tido sorte. Deixei para trás a obrigação de mudar o mundo. Já cometi corrupções. Só ainda sinto dificuldades em mentir, mas também aqui vejo melhoras. Trata-se só de deformar ligeiramente o que vai acontecendo, não de inventar tudo de novo. Tenho mais alguns anos diante de mim e depois quero acabar de repente. Não sei se valeu a pena mas também não me pergunto se valeu a pena. Há muitas coisas assim. Não é desistir, é só dar demasiada importância a coisas que não a têm. A vida é uma delas. Ganha um valor particular quando deixamos de a encarar como o centro de tudo. É só por acaso que gostamos das flores e do mar. E, claro, que é um bom acaso. Mas mais do que isso não. Quase gosto da vida que tenho. Quando a quis toda não gostava de mim. Agora há dias em que aceito que o tempo passe por mim e me leve para onde só ele sabe. ...Vivo sozinho. Passam pessoas, mas nunca ficam por muito tempo. A partir de certa altura intrometem-se tédios por entre as frases e não sabemos continuar. Não insisto. Há muitas pessoas. Não vale ter medo. Há muito que o amor mostrou ser um fracasso. No dia seguinte, no escritório, esperam-me problemas por resolver e decisões que valem dinheiro. Não posso sofrer. Claro que por vezes me sinto triste como toda a gente. Mas é uma tristeza doce, como um descanso. E como não espero nada, não faço nada. De uma maneira ou de outra também acabarei por adormecer esta noite.» 
Pedro Paixão

segunda-feira, 18 de março de 2013

After You

[photo by play bleu]

"Ela sabe que não se consegue precisar o momento, a hora, o dia em que uma pessoa fica apaixonada. Sempre um pouco antes, sempre um pouco depois. Ela sabe que não se pode revelar definitivamente como, e porquê, uma pessoa ficou apaixonada por esta pessoa, precisamente esta, e não por outra muito parecida com ela. Qualquer razão perde a razão. O que uma pessoa pode sentir é se está ou não apaixonada. Que houve um estreito abismo, sem saber quando nem como, sobre o qual sabe que saltou. Sem poder avaliar as consequências. Como uma doença. Não é só isso. Uma pessoa quando está apaixonada não está continuamente apaixonada, muito menos com a mesma intensidade. Varia muito. Acontece uma pessoa duvidar se está ou não apaixonada. Ficar totalmente baralhada. É mais fácil uma pessoa sentir a paixão por outra pessoa quando ela não está presente. Isso parece-lhe um facto. A sua ausência aumenta o poder da sua presença. A paixão é mais sua, mais inteira, há menos interferências. Com ela é assim. Sente um vazio que só o outro, único no mundo todo, vai poder preencher, sarar, cuidar. Uma espécie de saudade imperiosa. Uma questão de vida ou de morte."
Pedro Paixão

segunda-feira, 11 de março de 2013

Oh My Lord

[photo by play bleu 2012]

“O que amamos está condenado a morrer. E, no entanto, continuamos como se o não soubéssemos.”

Pedro Paixão, Súbita aflição, O mundo é tudo o que acontece